Caso Marcius Melhem: o que separa a paquera do assédio?
Especialista em Compliance afirma que
relacionamento entre chefe e subordinado ultrapassa limites éticos e pode ser
punido, inclusive com justa causa.
As denúncias de assédio
sexual contra o ex-chefe do Departamento de Humor da TV Globo, Marcius Melhem,
ainda não tiveram desfecho, mas já serviram para revelar desvios éticos na relação
entre líder e liderados nos estúdios da emissora. Em entrevistas e depoimento à
polícia, o humorista admitiu ter se relacionado com atrizes do seu
departamento, mas se defendeu alegando que foram relações consensuais.
O advogado especialista
em Compliance e autor do livro Entrevista Forense Corporativa, André Costa, afirma que
relacionar-se com um subordinado sem comunicar a empresa é uma infração ética e
pode ser punida até com a demissão por justa causa porque há conflito de
interesses. “As investigações
do Caso Melhem vão concluir se houve assédio ou se as relações foram
consensuais, mas independentemente disso, há uma infração ética comprovada. Ele
era o diretor do departamento, não poderia se relacionar com suas subordinadas
de forma oculta e mantendo a relação hierárquica, sob pena de colocar sob
suspeita todas as suas decisões em relação a essas pessoas, incluindo
promoções, méritos, demissões e movimentações”, explica.
Paquera ou
assédio?
André
Costa diz que quando um relacionamento entre líder e liderado termina, é
imprevisível o reflexo disso nas relações de trabalho. O advogado acrescenta
que, mesmo uma relação consensual pode se transformar em assédio a partir do
momento em que uma das partes diz que não quer mais. “Quando a outra parte aceita o término
tranquilamente, tudo bem, mas se ela insiste em manter a relação, mesmo diante
das negativas, isso já passa a ser considerado assédio. Quem está na posição de
subordinado pode sentir medo de perder o emprego e não denunciar”,
explica.
Assédio no ambiente de trabalho deve ser
punido com rigor
Promoções e
aumentos
Mesmo que
o relacionamento seja público, o advogado recomenda que não haja subordinação
entre o casal. “Qual a
imagem que fica a todos os demais colegas quando um dos integrantes do casal é
promovido e justamente pelo outro integrante do casal? Por que foi escalado
para um trabalho mais interessante? Por que foi transferido para uma 'boa
filial'? Qualquer decisão desse chefe pode ser considerada suspeita. O ideal é
separar o casal de departamento, para que as decisões de um não interfiram no
trabalho do outro, nem para beneficiar, nem para perseguir”,
afirma Costa.
O advogado da Shield
Compliance, consultoria especializada em casos de assédio sexual, vai além: “Não deve haver subordinação, nem
conexão entre as funções do casal na empresa. Imagine que um deles trabalhe no
departamento de compras e o outro, numa função que aprove os pedidos ou
autorize os pagamentos? Sempre pode haver desconfiança e isso pode prejudicar o
ambiente de trabalho".
O
advogado especialista em Compliance André Costa
Regras bem
definidas
O
especialista recomenda que as empresas estabeleçam regras no contrato de
trabalho em relação à conduta pessoal no ambiente corporativo, para se
protegerem de eventuais problemas no futuro. “Se a existência desse relacionamento interferir na rotina
do trabalho ou provocar danos à imagem da empresa, como em um caso de denúncia
de crime, esse líder pode, inclusive, ser demitido por justa causa, além de ser
denunciado às autoridades”, defende André Costa.
Proibir
relacionamentos?
André
Costa entende que é impossível e invasivo impedir que duas pessoas que
trabalhem juntas se interessem uma pela outra e iniciem um relacionamento. Ele
explica que há empresas que têm como norma não contratar casais, e outras que
não se importam. “Algumas
empresas contratam casais por ser uma forma de atrair mão-de-obra especializada
em localidades distantes. Outras evitam justamente para fugir do conflito de
interesses. Não é preciso e nem seria possível impedir que surja um
relacionamento entre dois colegas de trabalho, mas é fundamental ter regras
claras para todos”, conclui.
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