Trabalho infantil: lideranças ligadas a iniciativas que combatem o problema falam sobre perspectivas
Há no mundo, segundo dados da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) de 2020, cerca de 160 milhões de
jovens em situação de trabalho infantil, o que impacta diretamente no seu
desenvolvimento físico, psicológico e educacional.
No Dia Mundial da Luta Contra o Trabalho
Infantil (12 de junho), lideranças ligadas a iniciativas que visam combater o
problema falam sobre a situação atual e perspectivas. Devido à pandemia de
COVID-19, notou-se uma estagnação na tendência de queda percebida entre 2000 e
2016, que apontava a redução em 94 milhões de crianças inseridas no trabalho
infantil. A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que o desfavorecimento
socioeconômico pós-pandemia tenha contribuído para o agravamento da situação.
Para a Japan Tobacco International (JTI),
responsável pelo programa Alcançando a Redução do Trabalho Infantil Pelo
Suporte à Educação (ARISE),
que desenvolve e implementa atividades que progressivamente diminuam o trabalho
infantil no campo, e para o Instituto
Crescer Legal, que oferece alternativas às crianças e
adolescentes rurais, sobretudo na área educacional, há consenso de que a
educação é pauta prioritária nas ações de combate ao trabalho infantil.
Para tratar do assunto, conversamos com
Marinês Kittel, supervisora de Projetos Sociais da Japan Tobacco International
(JTI), Flavio Goulart, diretor de Assuntos Corporativos & Comunicação da
JTI e Nádia Fengler Solf, gerente do Instituto Crescer Legal, iniciativa do
Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (SindiTabaco) para combate ao
trabalho infantil.
Segundo a OIT e do Fundo das Nações
Unidas para a Infância (UNICEF), o trabalho infantil teve um aumento pela
primeira vez em duas décadas. Como as organizações preocupadas com o problema
enfrentam o desafio de reverter essa tendência?
Marinês – O trabalho infantil no campo é complexo
e não se resolve apenas pelas ações pontuais de empresas, em que pesem os
investimentos e esforços dedicados à conscientização, educação das crianças e
profissionalização dos jovens. Esse trabalho é de uma rede de agentes, que
precisa se mobilizar e atuar em ações conjuntas. O sucesso na erradicação do
trabalho infantil depende da compreensão de suas causas, dos motivos que levam
ao problema, e do envolvimento e da colaboração de várias partes interessadas,
o que inclui as três esferas do governo, os sindicatos de empregadores e
trabalhadores, a sociedade civil, o Ministério Público e as comunidades
impactadas
Pesquisas apontam que há uma tendência
de crianças e jovens trabalharem ao lado de suas famílias como forma de
aumentar a renda familiar ou de resolver o problema de onde deixar as crianças
durante o trabalho dos pais no campo. O que pode e já vem sendo feito para
coibir essa prática?
MK - A JTI atua fortemente na
conscientização dos produtores integrados quanto à ilegalidade da utilização de
trabalho infantil na cadeia produtiva de tabaco, reportando às autoridades
competentes as irregularidades que são constatadas no campo, atendendo ao Termo
de Compromisso/Acordo firmado entre empresas associadas ao Sinditabaco e o
Ministério Público do Trabalho. Como setor, também atuamos na aprendizagem por
meio do Instituto Crescer Legal, onde jovens do ensino médio participam de
aulas de contraturno. As empresas vêm se estruturando e inserindo ações de
sustentabilidade onde um dos pilares é o social e aqui, o trabalho infantil. O
Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes, criado para assegurar
e fortalecer a implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) por
meio da articulação entre Estado, famílias e sociedade civil, tem um papel
fundamental no enfrentamento à violação, assim como o poder público. A
sociedade civil precisa contribuir porque combater o trabalho infantil é um
dever de todos os cidadãos e acreditamos que a informação e a mobilização são
ferramentas essenciais, principalmente quando temos o engajamento da Rede de
Proteção do Direitos da Criança e Adolescente.
Ainda de acordo com levantamento da OIT,
a pandemia de COVID-19 poderá levar outras 8,9 milhões de crianças e
adolescentes a ingressar no trabalho infantil no mundo até o final de 2022.
Como programas dedicados à diminuição do trabalho infantil no mundo, como o
ARISE (programa Alcançando a Redução do Trabalho Infantil pelo Suporte à
Educação) se organizaram diante desse cenário para lidar com o problema? Quais
os principais desafios?
MK – Pesquisas apontam que as principais
causas do trabalho infantil no Brasil são pobreza, má qualidade da educação e
questões culturais. Cientes disso, precisamos reforçar e incentivar o avanço na
desconstrução dos mitos que ainda envolvem o tema. É preciso focar na educação,
crianças precisam estar mais tempo na escola, local de formação do ser humano.
As experiências por meio dos nossos projetos nos mostram que, enquanto a
criança ou o jovem está na escola, está longe da exploração do trabalho
infantil e buscando conhecimento, preparando-se para o futuro. Para jovens do
meio rural, o maior desafio é ter a possibilidade de cursar um ensino médio
voltado para assuntos da agricultura e aqui reforço que temos várias
oportunidades nos três Estados do Sul do Brasil, que são as Escolas Família
Agrícola (já com a possibilidade de Aprendizagem), Escolas Técnicas, Casas
Familiares Rurais e o Instituto Crescer Legal, já citado anteriormente. Então,
é necessário atrair o jovem para a escola e mostrar a importância do estudo e
do conhecimento para um futuro digno.
No Brasil, o Congresso está analisando a
votação da PEC nº 18/2011, que propõe reduzir para 14 anos a idade mínima para
trabalhar. Atualmente, a contratação de adolescentes de 14 a 16 anos só está
autorizada na modalidade de aprendizagem profissional. Caso aprovada, quais
seriam os impactos dessa mudança para o jovem rural? Qual seria o caminho para
minimizar esses impactos?
MK – Tenho como princípio que o estudo é
imprescindível para a criança e o jovem em qualquer parte e na agricultura não
é diferente. Seria uma desconstrução do que está sendo realizado até então.
Segundo o Plano Nacional de PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil)
e Plano Nacional de Proteção ao Adolescente Trabalhador, o trabalho precoce
alimenta um ciclo de miséria e destrói sonhos, prejudica a aprendizagem da
criança, quando não a tira da escola e a torna vulnerável em diversos aspectos,
incluindo a saúde, exposição à violência, assédio sexual, esforços físicos
intensos, acidentes com máquinas e animais no meio rural, entre outros.
Incentivar o trabalho e desestimular o estudo e a frequência na escola mantém
os altos graus de desigualdade social. O mito de que “só se aprende
trabalhando” não é verdade, pois há profissões que o indivíduo precisa estudar
muito antes de trabalhar e não é diferente na agricultura. Por isso, para
trabalhar enquanto adulto, precisa se preparar enquanto criança e jovem.
Precisamos sair do olhar do senso comum e investir mais em informação e dados.
Que medidas são adotadas pela JTI para
diminuir o trabalho infantil?
Flávio - A JTI adota uma série de medidas que
nos permite fiscalizar as práticas realizadas nas lavouras, além de criar
programas que contribuem à erradicação do trabalho infantil no campo. Possuímos
um ciclo de investimento social composto por três etapas, que são as Práticas
de Trabalho na Agricultura, que consiste na identificação de riscos aos
direitos humanos em toda a nossa cadeia de valor; o programa ARISE (Alcançando
a Redução do Trabalho Infantil pelo Suporte à Educação), que é um grande
laboratório de práticas sociais para prevenção e erradicação do trabalho
infantil nas lavouras de tabaco; e o Nossas Comunidades Rurais, que serve como
um multiplicador dos resultados das duas etapas anteriores.
No ARISE, a parceria com as Escolas
Família Agrícola de Santa Cruz do Sul (EFASC) e de Vale do Sol (EFASOL)
viabiliza a aprendizagem rural, permitindo que jovens em situação de
vulnerabilidade social venham a ser aprendizes nas instituições parceiras.
Essas instituições utilizam a
metodologia da Pedagogia da Alternância, que garante a permanência dos jovens
nas escolas enquanto eles têm a oportunidade de relacionar os estudos com a
vivência protegida e supervisionada no ambiente socioprofissional, que ocorre
na propriedade da família ou na comunidade.
Por que as políticas públicas ligadas à
Lei de Aprendizagem não são suficientes para evitar que o jovem rural saia das
escolas e ingresse precocemente no trabalho?
Flávio - Infelizmente, as políticas públicas de
incentivo à educação alcançam jovens somente até seus 14 anos. A partir desta
idade, as transformações inerentes ao seu crescimento, tanto na sua compleição
física quanto nas suas novas necessidades de consumo, o deixam em situação
muito vulnerável ao trabalho precoce.
Sabemos que a mudança nas diretrizes das
políticas públicas passa por um caminho longo e burocrático e não há tempo para
negligenciar a questão. Por essa razão, estamos constantemente focados em
intensificar as ações e estabelecer novas parcerias.
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O Instituto Crescer legal, fundado em 2015,
é uma iniciativa do Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco
(SindiTabaco) e suas empresas associadas que compartilhavam da preocupação com
as perspectivas – ou a falta delas - para os jovens no campo e sua inserção
precoce no trabalho.
Como a aprendizagem voltada ao
desenvolvimento desses jovens acaba se tornando a pauta prioritária da ação de
combate ao trabalho infantil?
Nádia - Ao se combater o trabalho infantil na
faixa etária da adolescência é fundamental ir além da conscientização acerca do
conceito de trabalho infantil. É preciso oferecer alternativas a esses jovens,
valorizando em primeiro lugar a escola, mas também complementar com outras
possibilidades que contribuam com sua preparação para o mundo do trabalho e a
geração de renda. É um momento importante de seu desenvolvimento, em que
busca inserção em grupos, à medida que está em um processo de desenvolvimento,
de transição da infância para a fase adulta, passando, portanto, a assumir
novas responsabilidades, inclusive da gestão da própria vida, de seus sonhos,
expectativas e escolhas para o futuro.
Nesse sentido, a aprendizagem
profissional tem se mostrado uma excelente alternativa por meio da Lei da
Aprendizagem, que é uma política pública efetiva aqui no Brasil porque contempla
requisitos como a frequência escolar e o necessário engajamento do jovem tanto
nas atividades escolares como, no outro turno, nas atividades da aprendizagem
profissional. Essa vivência representa muito mais do que uma primeira
experiência profissional; ela oferece também um desenvolvimento pessoal e de
competências comportamentais fundamentais para que ele esteja melhor preparado
para o mundo do trabalho.
No meio rural há pouquíssimas
oportunidades de aprendizagem profissional e o Instituto Crescer Legal, fundado
em 2015, viu na lei de aprendizagem a grande possibilidade de atuar frente às
questões do adolescente no campo, dos filhos dos produtores e trabalhadores na
cultura do tabaco.
O Programa de Aprendizagem Profissional
Rural e o Nós por Elas estão entre os principais projetos promovidos pelo
Instituto. Qual a importância de cada um deles para o desenvolvimento do jovem
no campo?
Nádia - O nosso Programa de Aprendizagem
Profissional Rural por meio do curso de gestão rural e empreendedorismo tem sido
reconhecido em âmbito nacional como uma prática efetiva, com resultados muito
promissores, tanto de oportunizar atividades teóricas e práticas no ambiente do
curso de aprendizagem, como na sua preparação para que se veja como um cidadão
do campo, capaz de fazer a diferença já durante sua adolescência e juventude e
que tenha horizontes ampliados em relação às possibilidade de escolha para seu
futuro.
É dada a ele, inclusive, a possibilidade
de enxergar o meio rural como uma escolha promissora, seja empreendendo junto à
propriedade da família, visualizando outras formas de gestão da propriedade com
diversificação, de gestão de recursos financeiros, consciência acerca dos
recursos naturais e melhores condições de trabalho.
Diante dessa consciência, ele passa a
ser um agente de transformação, individual ou da família e da comunidade como
um todo, assumindo posições de liderança, se engajando em atividades
comunitárias e associativas, dando continuidade à sua educação formal em busca
de cursos técnicos e graduação.
Esse desenvolvimento se estende mesmo
após a conclusão da etapa de aprendizagem profissional. Há um acompanhamento
periódico dos egressos para que possam dar continuidade e implementar seus
projetos elaborados durante aprendizagem curso. Essa nova etapa conta também
com o apoio de parceiros, como por exemplo da JTI, por meio do programa Jovem
Empreendedor Rural. O fato é que os jovens continuam muito próximos do
Instituto e de sua equipe, cultivando uma referência positiva na sua caminhada
de desenvolvimento.
O Nós por Elas – A voz feminina do campo
é um programa próprio do Instituto Crescer Legal voltado às egressas do
Programa de Aprendizagem. Com cinco edições, desde 2017, é uma parceria do
Instituto com a Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). No programa, as
meninas aprofundam temas referentes às questões da mulher no meio rural, como
questões de gênero, as dificuldades que a mulher e a jovem do meio rural
enfrentam no seu dia-a-dia, além de abordar caminhos possíveis para seu melhor
desenvolvimento. A busca por qualificação, construção de outros espaços no meio
rural, seja como gestora da propriedade familiar, ou como líder na comunidade
ou mesmo em instituições voltadas ao campo, como líderes sindicais.
Durante três meses, com a mediação de
uma educadora social do Instituto, as egressas discutem em grupo e aprofundam
temáticas. Também conhecem ferramentas da Comunicação Social por meio de
professores e técnicos da universidade parceira. Assim, passam a elaborar
roteiros de programas de rádio, identificação de fontes e gravação de
entrevistas, gravam os programas no estúdio da universidade. Os boletins
produzidos são veiculados em rádios por parceiros como a Associação dos
Fumicultores do Brasil (Afubra) e Sindicatos, além de agência de notícias e na
Internet.
O Nós por Elas é um programa bastante
transformador e multiplicador dessa mensagem das mulheres do campo, por meio
das vozes das meninas que são de diferentes localidades do meio rural do Sul do
Brasil.
Sobre a JTI
A Japan Tobacco International (JTI) é
uma empresa internacional líder em tabaco e cigarro eletrônico, com operações
em mais de 130 países. É proprietária de Winston, segunda marca mais vendida do
mundo, e de Camel. Outras marcas globais incluem Mevius e LD. Também é um dos
principais players no mercado internacional de cigarro eletrônico e tabaco
aquecido com as marcas Logic e Ploom. Com sede em Genebra, na Suíça, emprega
mais de 40 mil pessoas e foi premiada com o Global Top Employer por oito anos
consecutivos.
No Brasil, são mais de 1,2 mil
colaboradores em 8 Estados. A operação contempla a produção de tabaco – por
meio de mais de 10 mil produtores integrados no Rio Grande do Sul, Santa
Catarina e Paraná – compra, processamento e exportação de tabaco, fabricação,
venda e distribuição de cigarros em mais de 20 Estados do Brasil. As marcas
comercializadas são Winston, Natural American Spirit, Djarum, L.A e Camel, esta
última também exportada para a Bolívia. É Top Employer Brasil desde 2018 e, em
2022, ficou em #1 no ranking nacional.
A JTI acredita na liberdade de escolha de seus consumidores. Por isso, disponibiliza amplamente informações sobre as consequências do tabagismo. Saiba mais em www.jti.com/brasil.
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