Direito tributário nos últimos 20 anos: o que mudou?
Por Regiane Esturilio*
Nas últimas duas décadas, o direito
tributário no Brasil passou por mudanças consideráveis, especialmente por ter
relação direta com as finanças e a economia do país, sensíveis a fatores
externos e políticos. Ao longo desse tempo, estamos acompanhando as
transformações por meio da prática diária do direito tributário.
A famosa carga tributária tem um espaço
de destaque na trajetória do direito tributário brasileiro, por ser um problema
crônico pelos sucessivos aumentos. Na virada dos anos 2010 passamos até mesmo
pela alteração do critério de cálculo do Produto Interno Bruto (PIB), para
aumentá-lo artificialmente. Como a carga tributária é obtida por meio de quanto
pagamos de tributos sobre a riqueza produzida, com tal modificação não houve
aumento percentual, mas efetivamente a carga estava aumentando. A verdade é que
a carga só cresceu nos últimos anos.
Mas voltemos um pouco. O início dos anos
2000 foi marcado pela forte crise econômica de 1998, que refletiu na atividade
empresarial no Brasil e afetou profundamente muitas organizações. Essa crise
gerou consequências para o mundo corporativo e o próprio governo, que no ano
2000 editou o mais abrangente programa de benefício fiscal, chamado Refis, para
parcelamento de dívidas tributárias através de um percentual sobre o
faturamento, sem prazo definido para quitar as dívidas. A flutuação do mercado
era muito acelerada e a inconstância foi generalizada. O governo concentrou
esforços para a regularização, mas depois se empenhou ainda mais para extinguir
o benefício, excluindo muitas empresas do programa.
Durante esses 20 anos, as mudanças foram
intensas e constantes. Na legislação tributária tivemos o surgimento do Simples
Nacional, do regime não cumulativo do PIS-Cofins e da Lei da Liberdade
Econômica. Foram renovados os códigos Civil e Processual Civil, com impactos diretos
nas medidas de redirecionamento de cobranças aos sócios das empresas, e com
permissão da penhora de dinheiro em contas bancárias. A jurisprudência, apesar
da implantação do regime de precedentes (recursos repetitivos e de repercussão
geral nos Tribunais Superiores), não impediu a prolação de decisões
conflitantes sobre bases fáticas idênticas, gerando insegurança jurídica. Por
exemplo, temos o caso do ICMS na base de cálculo de outros tributos. O Supremo
Tribunal Federal o afastou da incidência do PIS e da Cofins, porque o imposto
estadual não é faturamento da empresa, mas o admitiu como se fosse no cálculo
da contribuição previdenciária quando calculada sobre o faturamento, em
substituição à folha de pagamentos.
A Constituição Federal, que passa constantemente
por alterações através de emendas – desde 1988 foram 121, sofreu profundas
modificações no capítulo destinado ao Sistema Tributário Nacional e no que se
refere ao financiamento da Seguridade Social. Para tais assuntos, foram 12
emendas (Emendas 3, 20, 29, 33, 37, 39, 41, 42, 75, 87, 103 e 116). Muitas
questões foram submetidas ao Judiciário para a interpretação do que era
constitucional, se pró-contribuinte ou pró-fisco.
Num panorama mais recente, devido à
pandemia, houve setores de produtos e serviços que foram mais necessários e,
por decorrência, geraram negócios e tributos. Para aqueles que perderam
atividade e receitas, há uma demanda que ficou represada por conta da Covid-19,
e que agora tende a se recuperar. A questão da inflação, dos fatores externos
inéditos (novas ondas de contaminação e Guerra na Ucrânia) e a atual desarmonia
entre os Poderes da República trarão impactos que ainda não conhecemos.
Contudo, houve avanços, como podemos
ver. Nessa trajetória toda, muitas empresas passaram por aperfeiçoamento dos
seus departamentos jurídicos e fiscais, o que favoreceu a advocacia
personalizada, com assistência individual. A formação e o aperfeiçoamento de
equipes otimizaram a visão micro e macro, com muitas conseguindo conquistar, de
antemão, um atendimento eficaz às empresas.
O direito tributário é um ramo
reconhecido como complexo, porque sofre interferência direta da economia e da
política. Por outro lado, é diferencial ser especialista em cada cliente, de
forma individualizada e profunda, considerando o segmento de atuação, o porte e
o perfil dos seus dirigentes.
No atual cenário, destaco ainda a
frequente falta de imparcialidade do Poder Judiciário. Nesse contexto, uma
reforma tributária somente seria pura e viável após uma verdadeira reforma de
Estado, que revisse os termos de funcionamento, da divisão da federação e até
mesmo do regime de governo.
Por fim, na atualidade, tem sido foco de
assuntos tributários os princípios ESG (ambiental, social e de governança).
Afinal, ser uma empresa ambientalmente responsável é fundamental, e, além
disso, pode trazer benefícios. Lembramos, porém, que não basta uma atuação
individual para implementação dessa agenda. A soma de esforços jurídicos por
órgãos de classe e associações é necessária, o que pode auxiliar na busca por
regimes especiais e benefícios.
*Regiane Esturilio
é advogada sócia do escritório Esturilio Advogados, especializada em Direito
Tributário e Direito Penal Tributário.
Esturilio Advogados - A banca especializada em direito tributário e societário, cível, ambiental, penal econômico, tem atuação nacional e está à frente de 2.100 processos ativos em direito contencioso de companhias de grande representação nacional do segmento da madeira, celulose e papel cartão localizadas na Região Sul e Sudeste. Comandado pela advogada e mestre Regiane Esturilio, o escritório oferece um serviço técnico altamente qualificado na área consultiva/preventiva, e para a defesa de casos contenciosos administrativos e judiciais, realiza o gerenciamento jurídico do passivo tributário, além do direito societário, civil ambiental e penal econômico. Informações pelo contato@esturilio.adv.br e fone (41) 3029-3303.
Nenhum comentário