PEC da Relevância traz impactos significativos e dúvidas em relação aos processos de insolvência
- por José Luis de Rosa e Mariana
Vasconcellos
No último dia 15 de julho, entrou em
vigor a Emenda Constitucional nº 125/2022, apelidada de “PEC da Relevância” no
Congresso Nacional. O nome surge pela inserção dos parágrafos 2º e 3º ao artigo
105 da Constituição, que versa sobre a competência do Superior Tribunal de
Justiça (“STJ”) e alinha-se à Súmula nº 07 para regular o acesso de Recursos
Especiais pela demonstração de relevância comprovada (ou presumida, como se
verá adiante) das questões de matéria infraconstitucional discutidas no
processo judicial. Agora dúvidas vêm à tona sobre sua aplicação nos processos
de insolvência (recuperação judicial, recuperação extrajudicial, falência e
insolvência transacional) e nos seus incidentes.
Pela nova previsão constitucional, o
recorrente deve demonstrar a relevância das referidas questões de direito, para
que seja feito um juízo de admissibilidade prévio pelo Tribunal Superior. Tal
juízo será exercido para se admitir determinado recurso especial ante o
consenso da existência de relevância por 2/3 dos membros do órgão competente
para o julgamento.
O novo texto constitucional esclarece
ainda que as hipóteses de relevância presumida são aquelas relativas às ações
penais; as ações de improbidade administrativa; ações cujo valor da causa
ultrapasse 500 salários mínimos; ações que podem gerar inelegibilidade;
hipóteses em que o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do
Superior Tribunal de Justiça e, por fim, nas outras hipóteses previstas em lei.
Não parece, ao menos de forma
automática, que os processos de insolvência se encontrem contemplados por
quaisquer das exceções ali apontadas, já que o processo de recuperação abarca
discussões eminentemente de direito empresarial, que não necessariamente
estejam vinculadas ao valor dos créditos. Assim, possivelmente caberá a cada
recorrente demonstrar individualmente que seu caso tem relevância sobre
questões de matéria infraconstitucional sob o risco de não ter seu recurso
conhecido pelo STJ.
Parece claro, contudo, que os recursos
dos processos de insolvência chegarão ao STJ independente de filtros
presumidos, por conta da intrínseca relevância multidisciplinar da matéria e
dos temas abordados.
Esse entendimento vem do reconhecimento
do princípio da preservação da empresa, previsto para o processo de recuperação
judicial, mas aplicável em todos os processos de insolvência enquanto princípio
basilar da Lei de Falências (Lei 11.101/2005), que se desdobra na satisfação
dos diversos interesses de stakeholders
envolvidos na crise empresarial. Os processos de insolvência saneiam a crise
financeira e seus impactos na sociedade, trabalhadores, fisco e demais
credores, seja pela reestruturação da empresa ou sua liquidação, promovendo
estímulo à atividade econômica, recuperando e distribuindo riqueza.
Seria impossível, portanto, afastar de
plano o reconhecimento da relevância das matérias que versem sobre processos de
insolvência, por não se enquadrarem às hipóteses taxativas de relevância
presumida.
Sob outro prisma, as questões envolvendo
processos de insolvência também poderão ser reconhecidas como de relevância
presumida dentro do filtro previsto de “outras hipóteses previstas em lei”,
como, por exemplo, a própria previsão do princípio da preservação da empresa,
estabelecido pelo art. 47 da Lei de Falências. Dessa forma, verifica-se que as
questões dos processos de insolvência poderão ser tratadas sob a ótica de
relevância presumida, ou mesmo como de demonstração de relevância para
admissibilidade pelo Tribunal Superior.
Não se acredita que o filtro da
relevância presumida seja aplicado quanto ao valor envolvido nos processos de
insolvência, uma vez que a maioria destes processos envolve dívidas muito
superiores a 500 salários mínimos. Tal filtro poderá ser aplicado em relação às
impugnações de crédito, as quais poderão envolver créditos de valor menor ao
limite legal indicado.
Por outro lado, pelo passar do tempo, as
questões dos processos de insolvência poderão ter negadas a sua admissibilidade
por relevância presumida em relação ao filtro da jurisprudência dominante do
Tribunal Superior, visto que a Lei de Falências já conta com orientação
jurisprudencial em determinados temas que vem sendo discutidos desde a edição
da lei no ano de 2005.
A relevância das questões de direito
federal infraconstitucional discutidas no âmbito dos processos de insolvência é
intrínseca à sua própria natureza, por atender os interesses da sociedade com a
manutenção e preservação da ordem econômica, em consonância com o princípio da
preservação da empresa, impondo-se a admissibilidade dos recursos especiais ao
Tribunal Superior, quando inexistente ou inaplicável a limitação de um dos seus
filtros.
* José Luis de Rosa é sócio do Cescon
Barrieu na área de Reestruturação e Insolvência e Mariana Vasconcellos é
assistente jurídica do Cescon Barrieu na área de Reestruturação e Insolvência
Sobre o Cescon Barrieu
O Cescon Barrieu é um dos principais escritórios de advocacia do Brasil, trabalhando de forma integrada em cinco escritórios no Brasil (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador e Brasília) e, também, em Toronto, Canadá. Seus advogados destacam-se pelo comprometimento com a defesa dos interesses de seus clientes e pela atuação em operações altamente sofisticadas e muitas vezes inéditas no mercado. O objetivo do escritório é ser sempre a primeira opção de seus clientes para suas questões jurídicas mais complexas e assuntos mais estratégicos. www.cesconbarrieu.com.br
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