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Semana de trabalho com 4 dias e férias ilimitadas: Até que ponto tratam-se de tendências para as empresas?


Michael Citadin*

Nas últimas décadas, vimos que o mundo do trabalho passou por diversas situações que mudaram a maneira como as pessoas encaram a forma de "ganhar o pão de cada dia". Após a inclusão massiva do home office devido à pandemia de covid-19, conseguimos ver outro modelo que tem ganhado cada vez mais adeptos, é o sistema 4x3. Nele, em vez de se dedicarem aos tradicionais 5 dias de trabalho por semana, colaboradores trabalham em 4 e folgam nos outros 3.

O esquema, normalmente, sugere a troca da jornada de 40 horas por semana, resultando em 8 horas diárias de trabalho, por 32 horas na semana, sendo 4 dias de 8 horas de trabalho diário. Neste cenário, muitas empresas adotam o sistema e deixam as sexta-feiras como o terceiro dia de folga, fazendo com que seja possível a emenda com o sábado e o domingo.

Mas, além da inclusão do home office por causa da pandemia, por quais outros motivos surgiram essas mudanças em torno da “nova” jornada de trabalho? Entendemos essa adoção como um processo evolutivo das práticas sociais. A pandemia ajudou a acelerar e trouxe ênfase em algumas questões relacionadas ao trabalho, como saúde mental, burnout e trabalho remoto. Além disso, podemos ver que há uma demanda por mais qualidade de vida, incluindo work-life balance, e as empresas vêm testando novos modelos de gestão que façam sentido para o momento em que vivemos. Outra variável dessa equação é a quantidade de pessoas buscando oferecer benefícios como diferenciais competitivos dentro da estratégia de atração e valorização de profissionais.

Contudo, existem casos e casos, nem sempre aumentar as horas de trabalho diária para compensar um dia a menos da semana será benéfico, O work-life balance precisa ser considerado como um todo, inclusive precisamos avaliar questões de saúde e burnout. É importante pesquisar o que faz mais sentido para o modelo de negócio, já vi equipes aumentarem seu foco e por consequência melhorar a produtividade, uma vez que a quantidade de horas reduziu, mas o volume de trabalho não.

Existem profissões e tipos de empresas muito diferentes, o que serve para um grupo não necessariamente é bom para outro, além de que as práticas de outros tempos nem sempre servem para os tempos atuais, parafraseando Thomas Jefferson. Em outras palavras, acredito que, socialmente, estamos testando novos modelos de trabalho e é preciso estar atento e de mente aberta para criarmos um futuro melhor. Mas, sem dúvida alguma, é uma excelente estratégia de atração e valorização de profissionais, especialmente para empresas de base tecnológica ou empresas na qual o trabalho desenvolvido possibilita a prática da redução de dias na semana.

É evidente que há um grande número de pessoas demandando o modelo 4x3, mas com base em algumas pesquisas é interessante observar que não há uma demanda necessariamente pela redução das horas semanais. Para além da empresa, vejo possibilidades interessantes para alguns setores da economia, como o de turismo, por exemplo, uma vez que as pessoas terão mais tempo para viajar em seus finais de semana. Entretanto, as empresas que decidirem adotar essa prática precisam ficar atentas à  produtividade, que é fator crítico para que esse modelo dê certo e gere valor para todos, sendo os profissionais, as empresas e a sociedade.

Uma forma de a empresa se estruturar para implementar o modelo e manter a operação normalmente, é organizar escalas com os times para que deem suporte e a operação continue sem interrupções. Além disso, investir no desenvolvimento das pessoas e acompanhar a produtividade da companhia é primordial. Vejo com bons olhos a prática, acredito que os profissionais vão ter capacidade de trabalhar mais focados, serem mais criativos e produtivos, uma vez que a qualidade de vida e bem-estar devem aumentar.

Outra mudança na jornada de trabalho implementada pela gigante Netflix é as férias ilimitadas, porém precisamos pontuar que a legislação trabalhista é bem diferente entre países, o que pode funcionar nos EUA, por exemplo, nem sempre é permitido por lei aqui no Brasil. A inspiração da Netflix para implementar as férias ilimitadas vem da gestão ágil de pessoas, isso engloba dar autonomia para que elas mesmas decidam o que é melhor para o momento. Obviamente, isso demanda times e líderes preparados para que a prática funcione. No Brasil, vejo as férias ilimitadas distante da realidade da maioria das empresas, entretanto existem ótimas iniciativas como day-off mensal ou em datas especiais.

Por fim, acredito que todas essas mudanças na jornada de trabalho são reflexos da ressignificação do trabalho. Hoje, os profissionais não querem apenas uma posição que os paguem bem – o que sem sombras de dúvidas ainda é muito bem-vindo. As empresas precisam entregar mais. Depois de tempos difíceis, enfrentados ao longo da pandemia, não é de se surpreender que as pessoas busquem mais tempo para o autocuidado, para ficar com a família, estudar, viajar e etc. E isso não será humanamente possível se o trabalho tomar o maior tempo do dia a dia e exaurir o colaborador.

Às empresas cabe estudar e avaliar o que de fato faz sentido para sua operação. De nada adianta implantar iniciativas como férias ilimitadas e a semana de trabalho reduzida, de um dia para o outro, sem que haja um mínimo preparo operacional para isso. No longo prazo tende a não funcionar. 

Contudo, está mais do que claro que mudanças precisam ser feitas. Entendo que é imprescindível que as pessoas encontrem um trabalho que se sintam realizadas, valorizadas e respeitadas, e que ainda tenham espaço para aprender, se desenvolver e crescer. Certamente o funcionário com essas possibilidades será mais produtivo e engajado com a companhia na qual trabalha. Neste cenário, todos ganham e prosperam.

*Michael Citadin é cofundador e CPO da Unicorn Factory. Além disso, conta com PhD em Administração Estratégica pela Universidade do Minho e Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Com quase 20 anos de mercado profissional, Michael acumula experiência na área de Pessoas e Cultura, em importantes empresas brasileiras e multinacionais de diferentes segmentos e portes.

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