ESG para mim, desperdício para você?
Por Emanuel Pessoa, advogado especializado em
Governança, Direito Societário, Econômico e Contratos
Aconteceu de novo. Mais um evento
mundial com foco nas mudanças climáticas chamou a atenção pelo uso de jatos
particulares, que emitem de 5 a 14 vezes mais gases de efeito estufa por
passageiro do que um avião comercial, segundo o grupo de defesa europeu
Transporte e Meio Ambiente. Foi na COP27, a Conferência das Partes das Nações
Unidas sobre Mudanças Climáticas, realizada no Egito. Desta vez, no entanto, o
que mais despertou curiosidade é que alguns dos ocupantes eram justamente
ativistas.
Esse tipo de atitude lembra uma frase
clássica de Millôr Fernandes: "democracia é quando eu mando em você;
ditadura é quando você manda em mim". Analogicamente, poderíamos dizer que
situações como essa levam a pessoa média a pensar que "ESG é quando você
deixa de poluir; necessidade é quando eu poluo". Afinal, como John Kerry,
o enviado especial do Clima dos Estados Unidos - também conhecido como Czar do
Clima -, pode reclamar tanto do aquecimento global se ele mesmo usa jatos
privados?
O aumento do uso de jatos particulares
já acendeu alerta mundo afora. No Brasil, até junho, pelo menos, havia fila de
espera para comprar uma máquina dessas. No mundo, foram 3,3 milhões de voos com
aeronaves privativas em 2021, um recorde, claro.
O grande problema é que, de modo geral,
as contribuições de um único indivíduo na defesa de políticas protetivas ambientais
trazem ganhos meramente marginais para o mesmo, pois para a sua eficácia ser
perceptível é preciso que se dê a sua adoção em larga escala, enquanto que cada
indivíduo sente, diretamente, os custos dessa adoção isolada.
A título de exemplo, pensemos em carros
elétricos. Quando uma única pessoa troca um carro à gasolina por um veículo
elétrico, a melhora dos índices de poluição é imperceptível, praticamente nula,
mas essa pessoa suporta o valor elevado do carro e os custos bem maiores com a
sua manutenção. Por outro lado, se um grande número de pessoas faz essa troca,
a redução se torna perceptível. Isso sem contar que uma venda mais elevada de
carros elétricos atrai outros players para o mercado, barateando o veículo e
sua manutenção no longo prazo. Evidentemente, estamos desconsiderando, para
este exemplo, a possibilidade que esse aumento do uso de carros elétricos
aumente a queima de carvão para obtenção de energia elétrica.
Assim, além da conscientização da
importância da adoção de medidas protetivas para o meio ambiente, é preciso
fornecer incentivos às pessoas para que elas adotem essas práticas de forma
mais rápida. Do ponto de vista corporativo, isso já é uma realidade com os
green bonds, que empresas como a Suzano utilizam para fazer captações a taxas
de juros bastante baixas.
Para as pessoas, a solução não é
encarecer o padrão atual de consumo, como pregam os defensores de impostos mais
altos sobre a gasolina, pois os mais pobres seriam desproporcionalmente
penalizados, já que seguiriam sem conseguir bancar a transição de seu padrão de
consumo.
A solução é justamente a oposta. É
preciso que sejam reduzidos os custos para a adoção de padrões de consumo mais
sustentáveis, o que além de atrair mais rapidamente as pessoas, irá também
atrair mais investimentos, contribuindo para baratear ainda mais os custos com
a competição e o desenvolvimento de novas tecnologias.
Assim, uma adoção verdadeira do
"E" no consumo demanda incentivos muito claros, tais como a redução
de tributos, a simplificação da regulação sobre investimentos produtivos e o
estímulo à concorrência.
Insistir em outro tipo de abordagem
criaria um "padrão de consumo ESG" artificial, já que ele seria
imposto aos desfavorecidos pela simples redução do seu padrão de vida, criando
uma série de efeitos negativos na economia, ao passo que os mais ricos poderiam
simplesmente pagar o preço adicional. Afinal, quem pode comprar uma Ferrari
pode pagar dez reais por um litro de gasolina.
*Emanuel Pessoa é advogado especializado em Inovação e Direito Econômico. Mestre em Direito pela Harvard Law School, é Doutor em Direito Econômico pela Universidade de São Paulo, Bacharel e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará.
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