O início da despedida do novo (que já ficou velho) normal
*Ana Gabriela Andriani, psicóloga, mestre e doutora pela Unicamp
Muito se falou sobre o novo normal no
início da pandemia da Covid-19 no Brasil. A rotina adotou uma extensa lista de
cuidados com a saúde: álcool em gel, máscara, distanciamento social, fuga de
locais fechados... Foram meses seguindo o checklist, cuidando da nossa saúde e
das pessoas ao nosso redor, até que isso virou o nosso normal. Nos acostumamos,
inclusive, ao incômodo da máscara. Quem nunca chegou em casa e continuou com a
proteção no rosto? Ou então na mesa do restaurante para comer?
Agora, com o avanço da vacinação, parece
que o pesadelo está acabando e que a vida vai voltar ao antigo normal. Claro
que a pandemia não acabou, ainda mais no Brasil, com números elevados de
infecções e mortes. Mas aqui estamos falando em esperança, aquela luz no fim do
túnel, de um futuro que parece possível e próximo. O primeiro passo de uma
retomada da economia, da vida social e até mesmo da saúde mental.
Posso dizer que mais de 60% das pessoas
que atendo, que têm entre 30-50 anos, estão otimistas e animadas com as
recentes notícias da antecipação da vacinação. Todos fazendo planos para os
próximos meses, planos que não incluem viagens ou grandes extravagâncias, mas
que mostram simplicidade e exaltam os valores da vida. Atualmente, a felicidade
está associada à diminuição das restrições e ao aumento da sensação de
liberdade. Poder fazer o que se tem vontade, ir para onde deseja, sem uma lista
de cuidados e obrigações.
Apesar do otimismo, seguimos cautelosos,
a passos lentos. É que esses últimos 16 meses não foram fáceis e muitas pessoas
precisaram de ajuda para enfrentar tantas mudanças e limitações. Em meu
consultório, por exemplo, a procura por ajuda psicológica teve um crescimento
de 30% e o mesmo aumento se mostrou em relação ao diagnóstico de casos de
ansiedade e depressão.
A saúde mental, muitas vezes tão
negligenciada em nossos cuidados, tornou-se uma das protagonistas desta
pandemia. Se antes era considerada algo menor, hoje não é mais. Se antes buscar
ajuda profissional era coisa de “louco”, atualmente conseguimos enxergar a
importância dessa prática para um equilíbrio entre vida social, amorosa e
profissional. Uma constatação que não é apenas de mercado. Diversas pesquisas
comprovaram a relevância desse equilíbrio.
Um levantamento realizado pela NOZ
Pesquisa e Inteligência, em parceria com o Instituto Bem do Estar, por exemplo,
mostrou que os efeitos colaterais da pandemia foram sentidos tanto no âmbito
fisico como no emocional. Depois de mais de um ano de estudo e isolamento
social, 6 em cada 10 pessoas afirmaram que sentem mais falta de energia,
preguiça ou cansaço excessivo. Além disso, 71% dos entrevistados se disseram
com mais medo, enquanto outros 65% se revelaram mais emotivos ou sensíveis.
Cuidar da saúde mental não tem a ver com
idade. Crianças, jovens, adultos e pessoas da terceira idade devem ficar
atentas aos sinais e sintomas vividos. As patologias podem se manifestar de
diversas formas, por isso o cuidado com a saúde psíquica torna-se uma questão
de saúde pública. Do paciente, da família e até da empresa. Essa última tem um
peso muito importante para esse equilíbrio. Quantos casos de burnout não notamos no
último ano?
Para o mundo corporativo, a pandemia
trouxe ainda mais mudanças, tanto na forma de trabalhar, como na de comunicar e
cuidar de seus funcionários. A tendência é que as empresas adotem mais
políticas voltadas à saúde mental dos funcionários. E já estamos vendo essa
teoria sendo aplicada na prática, na adoção de horários flexíveis, trabalho
híbrido, investimentos em recursos humanos, entre outros.
O novo normal é repleto de aprendizados.
Assim como aprendemos que ter desequilíbrios na vida é normal, também vimos que
a saúde mental é um dos nossos grandes bens e que pode e deve ser cuidada.
Apesar da parada brusca das atividades com a chegada da pandemia, em março de
2020, a volta será gradual. Ainda estamos nos recuperando do baque e todos estão
mais protetivos. Os abraços voltarão aos poucos, os encontros se tornarão mais
frequentes. Só que de forma lenta. Seguimos aprendendo e caminhando, dispostos
a descobrir esse equilíbrio entre o antigo e o novo normal.
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