Quais os desafios regulatórios do mercado de criptoativos no Brasil?
Para especialistas, questões vão de segurança para evitar crimes como lavagem de dinheiro a classificação da forma jurídica dos criptoativos; no entanto, todos concordam que manter liberdade do mercado é fundamental
À medida que os
criptoativos chamam cada vez mais atenção dos investidores, a regulação do
mercado se torna pauta relevante não só no Brasil, quanto no mundo. As
autoridades financeiras dos Estados Unidos, por exemplo, fizeram em maio a
primeira reunião para discutir o assunto. Enquanto isso, as Comissões de
Valores Mobiliários (em inglês, U.S. Securities and Exchange Commission,
geralmente referida pela sigla SEC) e de Negociação de Contratos de Futuros de
Commodities do país começaram a trabalhar em soluções para proteger os
investidores.
No Brasil não existe um
Marco Regulatório sobre o mercado e os criptoativos podem adotar diferentes
formas jurídicas, desde moedas até mercadorias e valores imobiliários.
Dependendo da classificação, diferentes autarquias e normas regem essa relação.
Hoje, três autarquias exercem alguma influência nas empresas de cripto no país:
a CVM, o Banco Central e a Receita Federal. Assim, as empresas precisam se
basear em interpretações e opiniões jurídicas sobre as leis vigentes.
Mas os desafios são
grandes: ao mesmo tempo que se discute uma regulação não só para trazer mais
segurança aos investidores, mas principalmente para evitar crimes como lavagem
de dinheiro e golpes, há uma questão sobre o risco de perder a liberdade do
mercado, já que o objetivo das criptomoedas é justamente garantir liberdade
para seus usuários e serem descentralizadas.
Quatro especialistas
abordaram os principais desafios de regular esse mercado:
Para Diego Perez, Presidente
da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs)
e cofundador da SMU
Investimentos, é preciso haver um amplo debate entre o mercado,
a sociedade civil e os reguladores antes de se apresentarem regulamentos para
esse tipo de mercado. “É muito importante colocar essas três frentes na mesa
para que seja transmitido no novo regulamento algo que tenha adesão e funcione
de fato. Alguns itens não necessitam de regulamentação, outros, quando há a necessidade,
os ajustes devem ser pontuais”, explica.
“O mercado de cripto
precisa ser regulamentado em questões de combate à lavagem de dinheiro,
financiamento do terrorismo ou outras situações que esse tipo de novidade
tecnológica possa sofrer. Do ponto de vista do que é um cripto ativo e qual
agência reguladora deveria ser responsável, há um cuidado especial, afinal, o
que não precisa ser regulado, deveria se manter assim, é o caso do Bitcoin, um
ativo ou bem, sujeito a direito civil de posse e propriedade. Já quando o ativo
representa um acordo mercantil, um contrato de investimento ou outro
relacionamento financeiro, às regulações de mercado de capitais e mercado de
pagamentos precisam observar os reais benefícios e regular os criptoativos de
uma maneira que eles consigam prosperar”.
Já para Carlos Russo, Chief
Financial Officer da Transfero, o primeiro desafio passa
pela classificação da forma jurídica dos criptoativos. “Enquanto países como
Portugal e Japão consideram os principais criptoativos como moedas, outros
países o consideram como um ativo financeiro. O fato do Brasil não considerar
criptoativos como o Bitcoin ou o Ethereum como ativos financeiros impossibilita
que fundos de investimento nacionais adquiram os mesmos em exchanges
brasileiras”.
“O segundo desafio
passa pela forma de tributação. Embora a IN 1.888 dê um passo-a-passo sobre
como recolher tributos para pessoas físicas, ainda há bastante incerteza quanto
à contabilização dos criptoativos por empresas brasileiras. Há também a questão
das stablecoins, cujo valor é pareado com moedas fiduciárias, e tokens de
protocolos De-Fi, que podem possuir características de valores mobiliários. Por
fim, falta a definição de um órgão regulador que supervisione as atividades das
exchanges de criptomoedas no país e quais obrigações são necessárias cumprir”,
acrescenta.
Victor Henrique Martins
Gomes,
Head Jurídico e Compliance na Foxbit, acredita que o principal desafio enfrentado
neste mercado no Brasil é a falta de conhecimento sobre o tema. “O primeiro
Projeto de Lei sobre criptoativos no Brasil, o famigerado PL 2303/2015, acabou
de completar 6 anos. Neste período, foram ouvidos especialistas, entusiastas,
funcionários públicos e o projeto ainda não decolou. Por outro lado, o mercado
segue em alto vapor: tivemos a revolução das finanças descentralizadas
(protocolo DeFi), maior adoção da rede blockchain, contratos inteligentes e a
criação de infinitos tokens. Estes movimentos fizeram com que o projeto se
tornasse obsoleto. Alguns outros projetos surgiram com um pouco mais de
maturidade, principalmente no Senado Federal, mas ainda longe de serem os mais
adequados”.
“Eu vejo que os
reguladores devem criar oportunidades para o crescimento da indústria, mas
também proteger os investidores e consumidores. Talvez este equilíbrio seja o
mais desafiador. No mais, o regulador deverá se apoiar nos players do mercado,
a exemplo da Associação Brasileira de Criptoativos (ABCripto). Com isso, iremos
transpor a barreira do desconhecido e passaremos a discutir sobre a correta
classificação dos diferentes criptoativos, a entidade responsável pela
supervisão dos Provedores de Serviços de Criptoativos e outros temas, com a
principal preocupação de não buscarmos uma regulação excessiva a ponto de
enfraquecer a inovação no Brasil, fazendo com que os investidores e exchanges
busquem outras jurisdições mais amigáveis para fomentar o mercado de
criptoativos”.
“Na minha visão o maior
desafio é dar legitimidade e segurança aos participantes sem asfixiar a
inovação, com regras muito pesadas que possam afastar startups e novos
entrantes”, finaliza Vinicius
Frias, CEO do Alter,
a primeira cripto conta do Brasil.
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